terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Trote universitário

TROTE UNIVERSITÁRIO I

FOLHA DE SÃO PAULO – 15/02/2009, CADERNO MAIS! PÁG. 3

+(c)omportamento

Laços de sangue
Ingresso das mulheres nas universidades inglesas pode ter enfraquecido os trotes violentos, diz Peter Burke
ERNANE GUIMARÃES NETODA REDAÇÃO

O trote, hoje, conseguiu tornar algumas universidades brasileiras equivalentes às melhores da Europa -mas da Europa do século 17. Para o historiador britânico Peter Burke -especialista em história cultural e professor emérito de Cambridge-, a evolução histórica desses "rituais de iniciação" pode ser esclarecedora. Na entrevista abaixo, o colunista da seção "Autores", do Mais!, que iniciou seus estudos em Oxford nos anos 1950, sugere que o fim dos trotes violentos em seu país pode estar ligado à entrada das mulheres no meio universitário. No Brasil, onde o trote ainda é visto como um sinal de prestígio pelos próprios calouros, a vontade de mostrar tradição pode ser um estímulo à agressividade: "As mais antigas e prestigiosas instituições é que se apegam à tradição, possivelmente para lembrar a todos de que se trata de velhas faculdade", acrescenta Burke.


FOLHA - Por que, historicamente, as vítimas de trotes não protestam? PETER BURKE - Isso é normal, mas às vezes as vítimas agem. Em Oxford, no século 17, havia um ritual de iniciação para os novatos em cada "college" que envolvia, entre outras coisas, ficar em pé sobre uma mesa e beber muita água salgada. Um dos calouros, que depois se tornaria um político famoso, o conde de Shaftesbury, organizou a resistência em seu "college" e foi bem-sucedido.


FOLHA - O que esses "atos de iniciação" podem dizer sobre a sociedade em que estão inseridos? BURKE - A existência desse tipo de ritual é tão comum que não diz muito sobre a sociedade específica, a não ser, talvez, que você estude a história do ritual ao longo do tempo. Quando eu era estudante, nos anos 1950, os "colleges" de Oxford ainda tinham rituais de iniciação, apesar de não serem tão violentos quanto os do século 17. Desde então, eles enfraqueceram. Isso pode mostrar que a "sociedade" está se tornando mais gentil. Mas outra explicação poderia ser a de que os antigos "colleges" para homens começaram a admitir mulheres nos anos 1970-80 e, assim, rituais de "macho" passaram a parecer inapropriados.

FOLHA - Num artigo de 2001 ("Bricolagem de tradições", Mais!, 18/3), o sr. parafraseia Eric Hobsbawm, para quem "o final do século 19 foi um período em que tradições, principalmente rituais e festivais, foram criadas por instituições novas como forma de legitimar um apelo ao passado". A violência do trote brasileiro é inversamente proporcional à tradição e ao respeito representados pelas instituições acadêmicas? BURKE - Para responder essa pergunta seria necessário fazer um estudo comparativo de diferentes universidades brasileiras. Minha impressão, talvez falsa, é a de que são as instituições mais antigas e prestigiosas, como a Faculdade de Direito [da USP], que se apegam à tradição, possivelmente para lembrar a todos de que se trata de velhas faculdades.

FOLHA - O sr. vê o trote nas universidades brasileiras mais como uma tentativa de reconhecer um grupo de elite, como na antiga tradição militar, ou como um entretenimento sadomasoquista contemporâneo? BURKE - Acredito que a função do ritual era originalmente criar laços entre os iniciados e entre eles e a instituição, mas, em ambos os casos, o costume cria possibilidades para sádicos, as quais estes exploram, conscientemente ou não.

Um comentário:

Unknown disse...

O Trote é legal, mas, não assim.
Com violência,bebidas alcólicas.
É irônico esses atos......
Eu acho que devia ter um estudo sobre esses comportamento.
Porque é muito estranho algumas pessoas estudarem e entrar em uma faculdade.
O que levam essas pessoas cometer esse lado irracional só pra abastecer a emoção que no fim é cega.

Michel Fernandes - Campos Gerais/MG